Mapeando a Diversidade: Cartografia na construção do corpo trans
escrito por a Andrógina
03 de fevereiro de 2024
A cartografia e a construção do meu corpo trans são conectadas de maneira intrincada e que desafia as normas cisgêneras, sexistas e binárias que historicamente moldaram a minha compreensão do corpo. A cartografia, que envolve a criação de mapas e representações do espaço à nossa volta, mostra-se como poderosa metáfora e ferramenta para desafiar e expandir a percepção sobre o corpo.
Tal mapeamento ou cartografia a que me refiro é um recorte, uma técnica que desenvolvi a partir da produção artística para estimular o meu reconhecimento sob a perspectiva trans e decifrar as entrelinhas dos signos (em principal, a linha) repensando perspectiva binária das noções de corpo e território, em que um espaço territorial, o limite nascem a partir das negociações que os definam.
Em uma sociedade na qual tradicionalmente perpetua-se a ideia de que o corpo é estritamente cisgênero, binário e sexista, a pesquisa pelo viés cartográfico torna-se meu veículo de emancipação e subversão. Já a abstração, presente não só na arte como na própria cartografia, permite a desconstrução das categorias rígidas de gênero pois se desdobra em definições micro e macro a todo instante. Ela possibilita a representação das identidades dissidentes, que não se encaixa nas definições convencionais, oferecendo um lugar para a expressão e a compreensão da diversidade da experiência “extra-binária”.
Da mesma forma que os mapas são construídos a partir de narrativas e acordos sociopolíticos, o corpo em sociedade é resultado de negociações e instituições que determinam o que é considerado "normal" e aceitável. O meu corpo trans é uma rejeição dessas normas, uma afirmação de que a identidade de gênero precisa ser amparada e ampliada. Tenho o direito de definir a minha própria identidade e existir socialmente de forma legítima e digna.
Esses processos de repensar o ato de mapear dentro de uma lógica considerada "divergente" desempenham um papel fundamental na reflexão sobre tais ideias (tanto de território quanto de corpo), o que permite ampliar a possibilidade de representação das muitas maneiras pelas quais vivenciado e expresso a minha identidade de gênero. Ao desconstruir esses mapas que refletem essa diversidade, posso desafiar a normatividade e estimular a aceitação e a inclusão de outros corpos.
Além disso, a ideia de territorialização no contexto corporal e de identidade envolve desenvolver em mim a autonomia e o poder de acessar demais corpos. Isso significa que tenho o direito de definir os meus próprios limites e não preciso me submeter a normas que restringem a minha expressão de gênero, mas que se flexibilizam de modo a respeitar a existência fora do eixo normativo também do outro. O processo “(re)cartográfico”, neste contexto, pode ser usado para mapear as fronteiras pessoais, para comunicar os meus desejos e para promover uma compreensão mais profunda e respeitosa das interações interpessoais.
Em resumo, a relação entre a cartografia e a construção de “corpx (lê-se “corpi”) é uma poderosa ferramenta para desafiar as normas ciscentradas, sexistas e binárias que moldam a sociedade. Ela me permite abstrair e representar a minha identidade diversa, capacitando-me a reivindicar autonomia e poder sobre o meu próprio corpo e desejos. Através da cartografia, posso mapear um caminho em direção a uma compreensão mais ampla dentro de um recurso que acessa de modo objetivo o consciente coletivo.
texto revisado por Julia Bernardet.