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Todo corpO é abstrato

escrito por a Andrógina   
 22 de janeiro de  2023

A ideia de corpo em nossa história é uma construção epistemológica médica, que constrói um vocabulário para definir corpo, sexos (LAQUEUR, 2001) e a questão social, demonstrando como as dinâmicas sociopolíticas definiram e demonizaram certas condições e identidades (FEDERICI, 2019). É esta historicidade que nos permite compreender como um corpo ganha formas e definições ao longo do tempo.

 

O ato de debruçarmo-nos e refletirmos sobre o corpo na história é, de algum modo, revisitar e, também, incitar um olhar crítico sobre como essas instituições (médica, jurídica, psicológica) fecharam-se e privilegiaram determinados corpos (MBEMBE, 2018). Deste ponto em diante, podemos ampliar em nossas reflexões a liberdade de reinterpretar e atualizar as opções em relação à definição do que seria um ser humano legítimo socialmente para, então, praticar de forma efetiva a democracia substancial, que deve ser exercida não simplesmente em prol da maioria, mas atendendo todo corpo que se faça presente, garantindo direito e dignidade.

 

A partir disso, percebe-se a importância da abstração, já que caracteriza-se por não se prender à figura como uma definição fechada, abolindo a representação e voltando “às coisas mesmas". É necessário debruçar-se sobre as possibilidades de origem das formas (ou não-formas), dos elementos básicos, iniciáticos, originários das linguagens, pois nesse processo arqueológico o corpo ganha territórios antes inexplorados ou marginalizados.  Assim, trata-se não só de um exercício, mas da própria resposta para retirar a exclusividade de um corpo pronto e polido.Como poderíamos definir o que é corpo com um molde rígido e engessado, ou negar direitos para quem não se encaixa ?

 

Permitir a abstração ao corpo não é deixar de entendê-lo ou ignorar o que foi aprendido sobre e com ele ao longo da história, mas sim ampliar seus significados nas instâncias sociais e humanas para além da perspectiva binária e ciscentrada, para que o corpo deixe de ser um produto social pré-fabricado e sua manifestação não seja privada de uma existência legítima e digna quando estiver fora de algum limite (cis)predeterminado.

texto revisado por Julia Bernardet.

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