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linha além do

corte e da fissura. 

escrito por a Andrógina   

 20 de agosto de  2022

O mundo é um reflexo contínuo de narrativas dominantes e, assim, tudo o que se conhece como estrutural surge justamente desse mecanismo que torna válida algumas perspectivas de mundo e ignora as demais. Contamina absolutamente tudo, por mais inofensivo ou puro que nos pareça, e com a linha não é diferente.

 

A linha apresenta-se como pronta e pura. “Estudada” por muitos artistas e acadêmicos, ela mostra-se como uma ferramenta quase infinita de significados. Contudo, todo este estudo torna-se um exercício exaustivo para resultados repetidos sob a visão ciscentrada, branca e heteronormativa, seja de homens ou mulheres cis, voltando-se a uma política binária da alteridade, onde não se é um, mas torna-se o outro. Um jogo inútil de perspectivas questionáveis que levam qualquer possibilidade de revolução à frustração, aproximando-se do delírio da guerra dos sexos, ou qualquer coisa parecida e tão ultrapassada quanto.

 

Entender os sujeitos sociais, sendo as únicas opções ser homem ou mulher a partir de uma régua pseudobiológica (tendo em vista pessoas intersexuais e a inclusão da psicologia como parte da corporeidade humana), condiciona o nosso pensamento a adotar limites prontos, levando à divisão. Assim como o limite de territórios inimigos, os quais têm suas fronteiras esvaziadas e achatadas em um único recurso: uma linha pré pronta, sem nenhum significado ou função além de cortar e dividir. Uma linha sem corpo.

 

Repensar a linha pela perspectivas de outras corpes é reestruturar a qualidade dos discursos propostos por uma elite que se diz artística e revolucionária,  com seus privilégios de pessoas brancas cisgêneras geralmente de classes alta e média. Este questionamento não é mera experimentação, e aprofunda-se e orienta-se pela contextualização com o objetivo de legitimar o corpx (corpi) a partir de recursos sociossexuais e sociais.

 

Quando estudada além da estrutura condicionada, a linha apossa-se de uma metafísica cirúrgica, evidenciando como a cisgeneridade e a heterocentralidade naturalizam suas próprias existências**. De acordo com a visão binária, não há nada além. Entretanto, a linha possui em si um corpo que sempre existiu no mundo.

 

Reestruturar essa linha não é uma resposta rápida a qualquer anseio exposto, mas uma  atenção na fala, como se narra esses diálogos e reflexões, que transcende o espetáculo da identidade trans e amplia a política sobre políticas e territórios dos corpos.

 

** pensando em por esse trecho: Na colonialidade de gênero, as identidades femininas  são construídas em oposição ao homem branco, cis-heterossexual, burguês, cristão, o sujeito colonial por excelência (NASCIMENTO, 2021)

 NASCIMENTO, Letícia Carolina Pereira do. Transfeminismo. São Paulo: Jandaíra, 2021 

texto revisado por Julia Bernardet.

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